O Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que o Instituto
Nacional do Seguro Social (INSS), em 15 dias, em caráter piloto,
autorize a realização de procedimentos por canais remotos para avaliação
social, exigidos para a concessão do Benefício Assistencial de
Prestação Continuada (BPC) a pessoas com deficiência. A decisão é de 23
de junho, e o processo teve como relator o ministro Bruno Dantas. A
dúvida, no entanto, é se o INSS está preparado para adotar a nova
sistemática e se o auxílio vai chegar à ponta, uma vez que as pessoas
inscritas no BPC, muitas em situação de miséria, não têm telefone ou
acesso à internet.
Por meio de nota, o
INSS informou que se prepara para iniciar a avaliação social remota,
que deve começar “a implementar no dia 6 de julho”. A autarquia, porém,
ainda não tem os detalhes de como funcionará o sistema. “O órgão está
definindo como será feito o procedimento”, aponta a nota. De acordo com o
advogado Diego Cherulli, vice-presidente do Instituto Brasileiro de
Direito Previdenciário (IBDP), “a decisão do TCU é justa, mas veio
atrasada”.
“Não adianta exigir que o INSS use
canais remotos se os cidadãos não têm acesso às tecnologias”, disse
Cherulli. Ele reiterou que ainda é “um mistério” o que o INSS
efetivamente vai fazer, mas como a “análise social para o BPC é
praticamente uma declaração do cidadão, não há visitas locais nem
maiores diligências, ela poderia, assim, ser feita por telefone ou
ligação de vídeo”, reforçou.
Para ter direito
ao BPC, esclareceu Cherulli, a pessoa deve ter renda de até um quarto do
salário mínimo (R$ 275). Lei recente, que ainda precisa ser
regulamentada, elevou o valor para até meio salário mínimo por pessoa na
casa (R$ 550).
João Badari, especialista em
direito previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin
Advogados, lembrou que, durante a pandemia, o INSS se estruturou para
fazer de forma remota os benefícios por incapacidade. “E deu certo.
Agora, com o tempo, vai ter que se adequar às necessidades do BPC. O
INSS, sem dúvida, está preparado. Porém não se pode garantir que o
cidadão consiga atender aos requisitos”, disse.
O
especialista em direito previdenciário Karlos Gomes, do Karlos Gad
Advocacia, explicou que, para ter direito ao BPC, é preciso ter mais de
65 anos ou deficiência física, mental, intelectual ou motora, desde que a
limitação impeça o beneficiário de gozar de uma vida plena em
sociedade. “E não basta preencher tais requisitos, também é necessário
não estar recebendo outro benefício”, observou.
Prazo
Com
as novas regras para o INSS, o prazo para concessão do BPC é de 90
dias. “Caso o requerente se sinta prejudicado, deve procurar um
especialista para ver a possibilidade de ajuizamento de uma ação
judicial para o recebimento após o prazo legal”, explica Karlos Gomes.
Sandro
Lucena Rosa, especialista em direito previdenciário e membro da
Comissão de Direito Previdenciário da OAB/GO ressaltou que também “deve
ser comprovada a situação de pobreza ou necessidade”. Ele reiterou que,
desde 2016, o INSS também exige que as pessoas se inscrevam no CadÚnico.
“Por isso, é sempre bom manter o cadastro atualizado. Ele pode ser
feito nos Centros de Referência de Assistência Social (Cras)”,
ressaltou.
Beneficiários se queixam da demora
Nas
redes sociais, várias pessoas reclamam da demora para marcar a perícia
no INSS, e muitas estão com medo de não conseguir e ter o BPC cancelado.
É o caso de uma beneficiária do Rio de Janeiro, mãe de três filhos, um
deles, com autismo, que não quis se identificar. Ela explicou que passa
por dificuldade e já está há dois anos e três meses na fila. “Eu preciso
muito fazer essa perícia. Sem o auxílio, vamos passar por mais
dificuldade ainda”, lamentou.
“Na minha
opinião, o INSS precisa atualizar o atendimento. Conheço uma pessoa que
até conseguiu fazer a perícia social, mas está esperando há 11 meses.
Outra entrou na Justiça. Acho péssimo o aplicativo, tive uma amiga que
foi deferida e nem sabe o motivo. Teve que buscar um advogado”, afirmou a
mãe do rapaz autista.
Luciene Leite, 42 anos,
aposentada, teve paralisia infantil quando ainda era um bebê, afirma
que, durante a pandemia, o processo de perícias ficou mais lento que o
normal. “De 2018 a 2020, fiquei um tempo sem receber o benefício, devido
a uma cirurgia que tive que fazer no pé. No ano passado voltei a
receber, mas preciso de uma nova perícia social, e já estou há dois
meses esperando”. A aposentada declara que “não gosta do sistema do
INSS”. “Acho uma bagunça e difícil de entender”, reforçou.
Para
Viviane Peres, diretora da Federação Nacional dos Trabalhadores em
Saúde, Previdência e Assistência Social (Fenasps), a teleavaliação não
resolve os processos represados, porque apenas 16% dos BPCs aguardam
análise social. Os demais dependem da análise do requerimento ou
avaliação médica. “Todos os argumentos para necessidade de teleavaliação
social, atribuindo a essa etapa a ‘culpa’ do represamento, são uma
falácia. O represamento dos BPCs não ocorre na pandemia, mas se
aprofundou com as plataformas e a transformação digital”, disse. Segundo
ela, no início da contaminação pelo coronavírus, havia mais de 500 mil
processos na fila. (VB e FS)
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